Acreditar na magia da escrita pode estar atrapalhando seu processo

Dia desses, eu estava acompanhando uma discussão sobre escrita quando o assunto se tornou o seguinte: existe livro que se escreve sozinho?

Para entender melhor, deixa eu explicar: sabe quando um autor, em entrevista, diz que o escrever foi super tranquilo porque o livro veio meio pronto na cabeça dele e a história se escreveu sozinha?

A pessoa que fez a pergunta acima queria saber se havia algum jeito de descobrir se uma ideia deveria mesmo virar livro ou se ela seria só uma ideia. Ou seja, ela queria saber se toda ideia tem potencial de virar uma história.

Eis que eu disse para mim mesma como resposta: óbvio, é só aplicar conflito e estrutura. Porém, essa não foi a resposta das outras pessoas na discussão.

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A resposta das outras pessoas foi que se uma ideia é forte o suficiente para virar um livro, ela se torna um livro porque isso vai naturalmente acontecer.

E a impressão que isso me passou foi de que nós, escritores, não temos controle nenhum sobre o que criamos, que nós somos apenas um meio pelo qual a história passa quando quer se manifestar.

Essa é uma ideia que fala sobre a magia da escrita, como se fossemos um médium que recebe uma mensagem do outro plano. E o problema disso é que tira a intencionalidade e autonomia do escritor.

Para mim, a ideia de que um livro se escreve sozinho é a porta de entrada para a afirmação de que escrever é um dom e que não é preciso estudar e falhar antes de lançar uma história. E eu não gosto disso porque não estou apenas escrevendo, estou trabalhando na história.

Deixa eu listar para vocês as minhas preocupações com o discurso da magia da escrita:

  1. Diz para aspirantes a escritores que se uma história não vem pronta e fácil para eles, eles não tem talento para escrever. O que, por sua vez, afasta muitas pessoas da escrita.
  2. Diz para escritores que não existe tentativa e erro, que se eles não conseguirem fazer uma ideia funcionar é porque a ideia não é boa o suficiente, e não porque faltou estruturação e técnica.
  3. Diz para aspirantes a escritores que não é preciso estudar técnicas de escrita para escrever, que se uma história quer ser contada, tudo vai fazer sentido sozinho.

Enfim, eu tenho muitos problemas com essa romantização, como vocês puderam ver, mas eu acho que o principal é que acreditar na magia da escrita faz com que ela se afaste das “pessoas comuns” e seja vista como algo que só gênios fazem.

E eu não acredito em gênios da literatura, pessoas tocados por entidades mágicas que usam os dedos deles para escrever histórias.

Prefiro acreditar que qualquer pessoa, comprometida o suficiente, pode escrever um livro porque teve uma boa ideia e quis estruturar uma história ao redor dela.

Para mim, essa opção mostra muito mais talento do que deixar que a história se escreva sozinha.

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