O que é a Arma de Tchekhov, e por que ela é importante para quem escreve

A arma de Tchekhov é um princípio dramático que foi proposto pelo escritor Anton Tchekhov.

Basicamente, o que esse princípio diz é que todos os elementos apresentados em uma história devem ser relevantes para a trama e tudo o que não for relevante deve ser cortado.

O princípio de Tchekhov, que também pode ser visto como uma “regrinha”, é que o leitor não seja enganado. Ele queria estabelecer que não houvesse falsas promessas num texto, que o leitor não criasse expectativas com algo que não levaria a nada.

Uma lição sobre ferramentas de escrita durante a ressonância magnética

Por que a Arma de Tchekhov é importante para o escritor?

Todo o meu interesse pela Arma de Tchekhov começou quando eu estava lendo um livro do Stephen Chbosky, Amigo Imaginário.

São muitas as coisas que acontecem nessa história, especialmente na segunda metade, mas a parte da sinopse que nos importa é que Christopher, o protagonista, tem 7 anos e depois de se mudar com a mãe para uma cidade pequena, fica desaparecido durante seis dias.

Ninguém sabe onde Christopher estava e o que ele ficou fazendo durante esses seis dias.

O que liga esse desaparecimento de Christopher aos acontecimentos da segunda metade da história é que outro menino, David Olson, também desapareceu na cidade cinquenta anos antes. Esses desaparecimentos são extremamente importantes para a trama.

Esse fato ficou pairando a minha cabeça durante toda a narrativa. Especialmente porque o autor falava, em quase todos os capítulos, de uma menina que também tinha desaparecido na cidade.

A primeira vez que ouvimos falar de Emily é quando Christopher vê a fotografia dela na caixa de leite, indicando que os pais estavam fazendo de tudo para encontrá-la.

Logo, sabendo que essa é uma história em que crianças, pelo menos algumas delas, desaparecem, imaginamos que a menção constante ao rosto de Emily na caixa de leite vá trazer alguma ligação com esse fato. Porém, não traz.

Emily não desapareceu para ser incorporada na trama da segunda metade. Ela apenas desapareceu, foi um crime qualquer, e isso me deixou muito incomodada porque cada vez que o autor citava o desaparecimento de Emily, eu ficava esperando que algo fosse ser revelado sobre isso.

Ao tornar a presença dessa menina uma constante na história, o autor criou expectativas em mim, enquanto leitora. Expectativas que não foram atendidas e que me deixaram frustrada com o fato.

Depois disso, eu lembrei que tinha visto um vídeo há muito tempo sobre como o roteiro e a edição do filme Esquadrão Suicida era um desastre.

Isso porque naquele vídeo, o apresentador falava sobre como o filme fez o setup, nos apresenta um item, mas não nos deu o payoff, não fez com que esse item valesse de algo para a trama.

Um exemplo: o filme “Esquadrão Suicida”

No filme, Capitão Bumerangue, assim que os personagens estão sendo apresentados, demostra muito afeto pelo seu unicórnio de pelúcia.

Esse item, inclusive, é mostrado na carta do personagem como um item muito estimado por ele. Na cena, o personagem guarda o unicórnio no bolso interno esquerdo do casaco.

No meio do filme, Capitão Bumerangue, em uma cena de ação, deixa o unicórnio cair do bolso interno e o pega rapidamente, devolvendo ao bolso no lado esquerdo do peito.

Até aqui, o roteiro nos deixou muito claro que o unicórnio é importante para o personagem e que pode ter um valor para a trama, já que existem duas cenas exclusivas para mostrar a pelúcia.

Eis que em uma nova cena de ação, Capitão Bumerangue leva uma facada no lado esquerdo do peito e o espectador pensa: ele não vai morrer porque é naquele bolso que está o unicórnio, o unicórnio vai salvar o Capitão Bumerangue!

Porém, quando o personagem remexe no casaco para nos mostrar o que salvou sua vida, ele puxa… uma pilha de dinheiro.

No vídeo abaixo, as considerações sobre o conceito começam em 7:45. No vídeo, o apresentador fala sobre a “regra dos 3” no roteiro: setup, reminder e payoff. Algo que traduzindo livremente seria como preparar, lembrar e pagar.

E apesar de ser um conceito diferente da arma de Tchekhov, e ser pensada para roteiros, funciona em livros e contos.

Esse recurso evita a frustração do leitor porque esse tipo de resolução, que não leva em consideração o que já foi estabelecido, é completamente anticlímax para o leitor ou espectador.

Enquanto estamos lendo um livro ou assistindo um filme, nós gostamos de bancar o detetive, de tentar descobrir o que está acontecendo e qual é o mistério antes que a história nos conte.

E a maneira mais fácil de fazer isso é entregar pistas e grifar objetos, situações ou pessoas.

Se eu quero que meu leitor entenda que o desaparecimento de uma criança é importante, vou deixar isso claro durante a história. Eu vou fazer com que os personagens, e consequentemente o leitor, não esqueça da criança em questão, eu vou grifar a existência dela e o que aconteceu com ela.

Fazer isso, deixar o personagem ou objeto, vivo na cabeça do leitor dá as pistas que ele precisa para tentar decifrar o mistério. Mas caso contrário, se eu quero que isso seja apenas algo corriqueiro, eu não preciso destacar.

Destacar algo corriqueiro e sem importância para a trama faz apenas com que o leitor fique frustrado. E causar frustração é o que o conceito de Arma de Tchekhov quer evitar.

A ideia por trás dessa “regrinha” é ensinar aos escritores e roteiristas a dar importância e destaque apenas ao que vai ser relevante e enriquecedor para o leitor.

Nesse sentido, todas as partes ganham. O escritor escreve uma obra com os elementos certos, que vão agradar o leitor, e o leitor se sente inteligente e satisfeito ao ler.

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