O certo é usar poeta ou poetisa?

Se alguém perguntasse para você se o certo é usar poeta ou poetisa, o que você diria? Certamente, que as duas estão certas e que palavra “poeta” é usada para designar homens que escrevem poesia, enquanto “poetisa” designa mulheres, não é?

Nos últimos anos, essa diferenciação de gênero está sendo cada vez menos usada, apontando para a transformação da palavra “poetisa” em arcaísmo. Hoje, vamos entender a questão envolvendo o uso de poeta ou poetisa.

Existe diferença entre autor ou escritor?

Como funciona o gênero na língua portuguesa

A língua portuguesa, em sua norma culta e dicionarizada, funciona através de algumas flexões em determinadas palavras.

Por exemplo, para dizer que alguém está carregando mais de uma laranja dentro de uma sacola, usamos uma flexão de numeral, dizemos “duas laranjas”.

O mesmo acontece quando precisamos determinar o gênero de uma palavras para nos referirmos a alguém ou a alguma coisa.

O gênero, na língua portuguesa em norma culta, se divide em dois: feminino e masculino. Portanto, é comum termos substantivos e adjetivos se flexionando nos dois gêneros dependendo do sujeito.

Veja os exemplos abaixo:

Ou seja, acima, nós flexionamos o substantivo “autor” e o adjetivo “inglês” de acordo com o gênero do sujeito.

Por isso, muitas palavras que fazem parte da língua portuguesa em norma culta existem na forma masculina e feminina, gerando uma listagem como a seguinte:

  • Autor e autora
  • Escritor e escritora
  • Editor e editora

Como você deve ter percebido, é comum que a flexão feminina de uma palavra receba um -a no final, uma das convenções para flexionar para o gênero feminino, enquanto a masculina se mantém igual.

Mas existem alguns casos em que a flexão feminina é diferente, como na listagem abaixo:

  • Cavalheiro e dama
  • Genro e nora
  • Homem e mulher

É nesse segundo caso que entra a diferenciação entre poeta e poetisa.

Qual é o feminino de poeta?

Então, de acordo com a norma culta, o feminino de poeta é poetisa.

Isso porque a norma padrão diz que, ao flexionar a palavra poeta em sua versão feminina para nos referirmos a uma mulher, devemos usar a palavra poetisa.

Segundo especialistas, a palavra poetisa remonta do século XVII e foi criada a partir da palavra “poeta” usando o sufixo -isa, que, assim como o -a, é um formador de palavras no feminino.

Outros exemplos de palavras que usam esse sufixo são:

  • Sacerdote e sacerdotisa
  • Profeta e profetisa

De acordo com as regras da norma culta, então, a diferença entre as palavras poeta e poetisa é a flexão de gênero. Poeta sendo usada para sujeitos no masculino, e poetisa para sujeitos no feminino.

Porém, é aqui que entramos em uma questão um pouco mais profunda (e polêmica) do que as regras da norma culta da língua portuguesa.

O preconceito intelectual presente em “poetisa”

Uma realidade da nossa sociedade é que as mulheres são comumente vistas como inferiores aos homens, especialmente em campos em que a produção se baseia no intelectual.

Por exemplo, é comum a cultura de que homens não leem livros escritos por mulheres, e que autoras costumavam usar pseudônimos ou abreviações de seus nomes para poderem ter seus livros vendidos para todos os públicos.

Um caso famoso é o de P. L. Travers e J. K. Rowling.

Ambas foram aconselhadas por suas editoras a utilizarem abreviações de seus nomes para apelarem ao público masculino também, pois se acreditava que meninos não se interessariam por livros escritos por mulheres.

Também existem os casos de livros de fantasia claramente adultos, por exemplo as histórias de Sarah J. Mass, serem comercializados apenas para meninas e para um público jovem porque sua autora é uma mulher.

Isso acontece porque existe um preconceito intelectual intrínseco na nossa sociedade que acredita que mulheres são inferiores aos homens. Logo, aquilo que é produzido por uma mulher, também seria inferior.

A conotação pejorativa de “poetisa”

Mas o que isso tem a ver com as palavras poeta e poetisa, você deve estar se perguntando. A resposta é: embora seja a nomenclatura correta de alguém que escreve versos, poetisa ganhou uma conotação pejorativa.

Como você deve ter imaginado, se algo produzido por uma mulher é considerado inferior, uma poetisa acabaria sendo considerada como inferior quando comparada a um poeta pelos mesmos motivos.

Assim, a palavra “poetisa” ganhou uma conotação pejorativa dentro do meio da poesia. Uma poetisa, então, não era mais apenas uma mulher que escrevia versos, mas uma poeta considerada inferior por ser mulher.

Por que poeta e não poetisa?

A discussão sobre o assunto não é recente, ele acontece, como apontou a Veja, desde o século XX.

Mulheres poetas desafiaram o meio da poesia para que o termo “poeta” se tornasse unissex, irritando gramáticos e poetas homens.

Cecília Meireles, por exemplo, escreveu:

“Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa
Não sou alegre e nem sou triste:
sou poeta”

Hoje, a palavra “poetisa” está em declínio, pois são pouquíssimas as poetas que utilizam esse termo para descreverem seu ofício. Logo, a diferença entre poeta e poetisa será que poetisa virou arcaísmo.

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